segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Conhecendo uma Comunidade Terapêutica

O programa terapêutico-educativo, a ser desenvolvido no período de tratamento, da Comunidade Terapêutica tem como objetivo ajudar o dependente químico a se tornar uma pessoa livre através da mudança de seu estilo de vida. A proposta da CT deve considerar que o dependente químico pode desenvolver-se nas diversas dimensões de um ser humano integral.

A CT é uma ajuda eficaz para quem tem necessidade de liberar as próprias energias vitais para poder ser um HOMEM em seu sentido pleno, adultos e autônomos, capaz de realizar um projeto de vida construtivo, de aprender a estar bem consigo mesmo e com os outros sem a “ajuda” de substâncias psicoativas.
Podemos utilizar a definição de CT de Maxwell Jones:
“grupo de pessoas que se unem com o objetivo comum e que possuem uma forte motivação para provocar mudanças”.

Este objetivo comum na maioria das vezes surge em um momento de crise onde o indivíduo apresenta uma desestruturação na sua vida em todas as áreas: física, mental, social, espiritual, familiar e profissional. É nesse momento que as pessoas diminuem as defesas, resistências e demonstram maior disponibilidade e abertura a mudanças porque não tem mais nada a perder. O objetivo da CT é:
“Parar a doença (que é incurável) e recuperar o indivíduo. Resgatar a auto-estima do dependente e cuidar de sua reinserção social”.

O papel da Equipe Transdisciplinar é ajudar o indivíduo a desenvolver seu potencial.
Para que a equipe seja eficaz é muito importante acreditar, independentemente de qualquer comportamento que o residente tenha tido, que ele pode MUDAR. Se não houver esta credibilidade, porque alguns residentes estão mais comprometidos e com maiores dificuldades para mudar, existe o risco de “abandono” desses residentes. Se a equipe acreditar que TODOS podem mudar dedicará a atenção que cada um precisa para que a mudança ocorra.

Outro aspecto importante a ser ressaltado a respeito da equipe é a transdisciplinaridedade. Antes de serem os profissionais da CT, são participantes e devem saber respeitar as regras desta para que as relações aconteçam em um ambiente familiar, "pois em uma família as pessoas se relacionam enquanto pessoas, não enquanto cargos, profissões". Este conceito interliga todos os setores e as responsabilidades são transferíveis.Por exemplo: o psicólogo pode assumir a responsabilidade do enfermeiro em uma situação de primeiros socorros, assim como orientar o residente responsável pelo setor de limpeza como deve ser feita a faxina geral da CT.

Nenhum elemento da equipe fica restrito, limitado ao seu cargo, pois em termos de funções existe um leque de responsabilidades. É evidente que esta transdisciplinariedade deve estar clara para todos da equipe para que não aconteçam “melindres” ou ingerências nas funções específicas de cada cargo como, por exemplo: o atendimento psicológico que é responsabilidade unicamente do psicólogo.

O ambiente da CT deve possibilitar a aprendizagem social oferecendo a oportunidade de interagir, escutar, aprender, projetar, envolver-se e crescer de maneira que normalmente, reflita a capacidade e o potencial individual e coletivo das pessoas que dele fazem parte. O comportamento começa a mudar através da auto-iniciativa do residente. Como ele vem de uma vivência de subcultura (valores não aceitos pela sociedade) devemos solicitar que ele exercite o AGIR COMO SE FOSSE honesto, pontual, solidário, etc. (valores aceitáveis pela sociedade) para que possa internalizá-los e vivenciá-los através da mudança do estilo de vida. A dinâmica deste processo depende, em parte, da organização social da CT e, em parte, da motivação das pessoas envolvidas. Os residentes são apoiados e atendidos pela equipe transdisciplinar: Existe uma divisão de trabalho e sobrevivência da CT. O enfoque deve ser sobre o processo e, se este é correto, teremos grandes chances de ter um resultado positivo como conseqüência.

O programa para ser eficaz deve ser aberto tanto internamente, entre os membros que fazem parte do ambiente social, quanto externamente com os devidos cuidados e respeito às regras fundamentais (as fronteiras da CT devem ser protegidas, mas as informações devem entrar e sair).
É claro que, como diz Harold Bridges, uma organização social aberta é: ... mais exposta às transformações, e justamente por isso, mais vulnerável. O processo é positivo, mas apresenta riscos, pois existem pessoas que querem alcançar resultados sema ter experiência para tal”.

Na CT devemos considerar tudo o que possibilita a criação de um ambiente terapêutico e educativo (já que a CT é um grupo de auto-ajuda permanente onde os componentes interagem a todo o momento): o número de residentes, suas experiências, idade, classe sócio-econômica e cultural, organização e regras, valores, divisão do trabalho e respectivas funções, administração da autoridade, instrumentos terapêuticos, estímulos educativos, o número e qualificação da equipe transdisciplinar.

As regras fundamentais são:
* Não ao uso de substâncias psicoativas;
* Não a violência;
* Não ao sexo.

Sobre a regra de renunciar, temporariamente, às relações sexuais é importante ressaltar que a sexualidade é uma energia de comunicação e a interrupção das relações sexuais estimula o residente a comunicar-se de outras maneiras tendo uma nova forma de aprendizado social. Permite também desenvolver aquela parte da afetividade que, até agora, permaneceu escondida e foi negada devido aos preconceitos em função de experiências pessoais.
Além dessas três regras fundamentais, são feitas duas solicitações, temporárias, para poder criarmos os pressupostos do trabalho pessoal e social sem jamais desrespeitarmos o direito fundamental à saúde e a liberdade de sair da CT no momento que a pessoa assim desejar:
* Renunciar totalmente a liberdade de movimentar-se e sair da CT sem, antes, falar com o grupo e a equipe transdisciplinar;
* Respeitar o contrato de auto-ajuda participando sempre de todas as atividades da CT.

O indivíduo em um grupo ou em uma CT que se recusa a colaborar prejudica o bem-estar do grupo. O indivíduo não deve ser prejudicado em função do grupo ou vice-versa, pois é importante que ele aprenda a entrar em uma relação equilibrada.
As regras devem ser definidas, tanto morais quanto éticas, e elaboradas de acordo com as necessidades da CT. Podem ser discutidas e alteradas, se necessários for, a partir de um consenso entre residentes e equipe transdisciplinar. É importante compreender que as regras existem para serem respeitadas e que sua transgressão leva a conseqüências que devem ser assumidas.

A equipe transdisciplinar deve garantir a todo residente o conhecimento e compreensão das regras para poder exigir o cumprimento das mesma. Existem cinco áreas para que alguém funcione em um determinado nível de equilíbrio.
São elas: família, pares, trabalho/escola, lei (regras sociais) e espiritualidade.
O desequilíbrio em uma dessas áreas pode desencadear em uma pessoa algumas relações disfuncionais. Levando isto em consideração devemos ter presente que um residente, muito provavelmente apresenta desequilíbrio em quase todas essas áreas o que faz com que ele se relacione de maneira completamente disfuncional consigo mesmo e com os outros.Para ajudá-lo devemos criar na CT um ambiente aonde ele possa se “exercitar” (como em uma academia de ginástica aonde exercitamos todo o corpo) e ter a compreensão necessária de que a droga é, apenas, um sintoma de algo mais profundo que precisa ser trabalhado e que, com certeza, está ligado a estas cinco áreas.

O processo de recuperação está diretamente inter-relacionado ao trabalho a ser desenvolvido nas cinco áreas, pois não podemos trabalhar as questões: família, espiritual, trabalho e desconsiderar as áreas da lei e dos pares e assim sucessivamente.
No ambiente da “ativa” aonde viviam anteriormente não existiam condições adequadas para serem pessoas com dignidade (como podiam viver corretamente morando embaixo da ponte, roubando, se prostituindo, etc.).
Na CT devemos oferecer aos residentes confidencialidade e um ambiente saudável, aonde exista seguranças física, psicológicas e sociais, considerando que não é a estrutura física que dá valores e sim pessoas (residentes e equipe que dela fazem parte).

A funcionalidade dentro da CT (micro-sociedade) deve ser muito similar à sociedade de origem para que o indivíduo possa experienciar situações para poder, depois, viver na sociedade. O programa terapêutico-educativo deve ser subdividido hierarquicamente de acordo com a maturidade do residente. Cada pessoa tem um papel na sociedade por isso, assim que o indivíduo é aceito como residente na CT, passa a ter um papel em sua estrutura, uma identidade e começa a se familiarizar com hierarquia, autoridade, responsabilidade, pontualidade, etc.
Através da interação individual e do grupo consegue-se grande compreensão da problemática do indivíduo, mas considera-se que a aprendizagem através da experiência (errando, acertando e experimentando as conseqüências) corresponde à influência mais eficaz para se atingir uma mudança duradoura (aprendizagem social).
Além das inúmeras possibilidades de aprendizagem social, a estrutura da CT deve ter uma certa mobilidade para oferecer e estimular a iniciativa do residente objetivando seu crescimento.

A conduta, o comportamento é sempre algo objetivo, observável aonde encontramos os progressos realizados pelo dependente. Na conduta encontramos os frutos e é aonde se concretizam os sucessos e as dificuldades do trabalho pessoal do residente nas áreas cognitivas, afetiva e espiritual.
A solicitação gradativa de mudanças na CT ajuda o residente a se responsabilizar pelo seu próprio processo de crescimento e participar ativamente no processo dos outros residentes e da administração do processo terapêutico-educativo da CT.

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